Leon Tolstoi
Admitir que a vida da humanidade possa ser dirigida pela razão é negar toda possibilidade de vida."
Leon Tolstoi
Álvares de Azevedo
Ao sol do meio-dia eu vi dormindo
Na calçada da rua um marinheiro,
Roncava a todo o pano o tal brejeiro
Do vinho nos vapores se expandindo!
Além um espanhol eu vi sorrindo,
Saboreando um cigarro feiticeiro,
Enchia de fumaça o quarto inteiro...
Parecia de gosto se esvaindo!
Mais longe estava um pobretão careca
De uma esquina lodosa no retiro
Enlevado tocando uma rabeca!...
Venturosa indolência! não deliro
Se morro de preguiça... o mais é seca!
Desta vida o que mais vale um suspiro?
desejo
"Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amada.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.
Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.
Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.
E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.
Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.
Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga "Isso é meu",
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.
Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja
amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar".
Poema de Victor Hugo
Tudo quanto penso,
Tudo quanto penso,
Tudo quanto sou
É um deserto imenso
Onde nem eu estou.
Extensão parada
Sem nada a estar ali,
Areia peneirada
Vou dar-lhe a ferroada
Da vida que vivi.
[...]
Fernando Pessoa, 18-3-1935
Terra
Terra
Quando eu me encontrava preso
Na cela de uma cadeia
Foi que eu vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim coberta de nuvens
Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
Ninguém supõe a morena
Dentro da estrela azulada
Na vertigem do ciname
Mando um abraço pra ti
Pequenina como se eu
Fosse o saudoso poeta
E fosses a Paraíba
Terra, Terra,
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?
Eu estou apaixonado
Por uma menina terra
Signo do elemento terra
Do mar se diz terra à vista
Terra para o pé firmeza
Terra para a mão carícia
Outros astros lhe são guia
Terra, Terra,
Por mais distante
O errante navegante
Quem, jamais, te esqueceria?
Eu sou um leão de fogo
Sem ti me consumiria
A mim mesmo eternamente
E de nada valeria
Acontecer de eu ser gente
E gente é outra alegria
Diferente das estrelas
Terra, Terra,
Por mais distante
O errante navegante
Quem, jamais, te esqueceria?
De onde num tempo num espaço
Que a força mande coragem
Pra gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas ao nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne
Terra, Terra,
Por mais distante
O errante navegante
Quem, jamais, te esqueceria?
Nas sacadas dos sobrados
Da velha São Salvador
Há lembranças de donzelas
Do tempo do imperador
Tudo tudo na Bahia
Faz a gente querer bem
A Bahia tem um jeito
Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem, jamais, te esqueceria?
Terra...
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